quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Qual tipo de linguagem estamos usando?


Shalom!

Tenho refletido sobre a linguagem que temos a cada dia usado para nos dirigirmos às pessoas dentro e fora da igreja. Fico me perguntando, será que realmente temos falando de forma que elas possam entender? A cada dia percebo que essa linguagem está mais caracterizada com uma falsa esperança revestida de uma religião pragmática.

Estamos usando um linguajar que no lugar de ajudarmos as pessoas, estamos às vezes as confundindo mais. Uma forma de falar que, no lugar de atrairmos, acaba levando as pessoas para longe da verdade. A Teologia da Prosperidade ganhou espaço e irrompeu com força dentro das igrejas cristãs. Ela tem sido difundida com promessas e mais promessas imediatistas que se realmente fossem verdade, todos os simpatizantes do evangelho já estariam com a vida completamente resolvida.

Já tinha parado algumas vezes para rever meus conceitos, desde que havia ingressado no seminário, porém uma das coisas que mais me fizeram refletir sobre os males causados por essas promessas imediatas e frases sem conexão com a realidade, foi em um culto, onde estávamos reunidos e alguém disse para uma irmã: Hoje é o dia da sua vitória. Ao findar o culto, ela me procurou e perguntou o que realmente era a vitória? Eu lhe respondi que depende e muito. Então ela, que havia sido abandonada pelo esposo, que lhe deixara, com dois filhos para criar, me disse: “Para mim a minha vitória é o meu esposo voltar para casa”! Confesso que as suas palavras me comoveram e me despedaçaram. E realmente o esposo não voltou, pelo menos por aqueles dias.

Acredito que seria vão tentar explicar para uma mulher completamente ferida pelas circunstâncias da vida, que Deus queria ensiná-la alguma coisa nesse sofrimento, porque na verdade, à priori, não era isso que ela precisava ouvir. E seguindo a Bíblia, seria mais correto chorar com os que choram.

Já estive conversando com muitas pessoas que estão vivendo uma crise existencial por causa de frases decoradas repetidas por alguns cristãos, palavras sem sentido, promessas irreais e falsas esperanças. Pessoas que foram abordadas por supostos “animadores” que na verdade, causaram mais confusão no lugar de dar orientação, duvida no lugar de esclarecimento, fardo no lugar de alivio, maldição no lugar de benção.

Acredito que precisamos ser mais francos com as pessoas e dizermos para elas que a vida é difícil e que enquanto não passarmos dessa vida para a outra, não haverá descanso nas labutas, não faltarão desencontros, mas a Boa Notícia é que nunca estaremos sós, Jesus de Nazaré estará conosco nessa jornada.

Precisamos “desmecanizar” o nosso linguajar para um linguajar mais apropriado para a vida e ainda mais, sermos a verdadeira expressão do amor de Deus. Encarnar as nossas palavras. As pessoas não são parte de um processo que deveria ser mecanizado e nem são uma parte do processo que envolve as nossas vidas em particular. Não! As pessoas são o processo em si mesmo. Por esse motivo elas precisam entender o que estamos dizendo. Não podemos ignorar o fato que as pessoas são o alvo da cruz de Cristo. Foi pelas pessoas, isso mesmo, por gente, que Jesus deu a sua vida na cruz do calvário.

Para isso precisamos entender que estamos lidando com pessoas que tem necessidades, objetivos, frustrações, decepções, dúvidas, encantos, sonhos e idéias. Então, devemos usar uma linguagem do cotidiano, uma linguagem inteligível, sem abstrações. Eugene H. Peterson, diz que às vezes usamos uma linguagem propagandeira, que mais parece esta direcionada a um público desconexo. Ele diz: “É uma linguagem apropriada para multidões de desconhecidos, mas de utilidade duvidosa para transmitir um conteúdo pessoal...”.[1]

Penso que a maioria das pessoas que vão as nossas igrejas acham que nós não somos seres humanos, que não enfrentamos problemas, dificuldades, tentações, desilusões, dores e sofrimentos. Alguns filósofos do passado chegaram a insinuar que a religião no lugar de ajudar as pessoas, as infantilizava. Em vez de ajudar as pessoas a enfrentar a realidade com galhardia, transfere isso apenas uma esperança ilusória.

Como cristãos que somos, devemos nos despir da sabedoria desse século, das frases desconexas com a realidade, do ufanismo religioso que estamos imersos, da vulgarização do sagrado, da linguagem imediatista e ilusória para uma linguagem mais humana e realista, como Jesus o fez. Podemos fazer o que a Bíblia Sagrada nos propõem, usar a linguagem que Jesus usou. E, Paulo deixa isso bem claro, quando diz: “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a morte, e morte de cruz!” (Fp 2.5-8).

Qual é a proposta? Jesus se humanizou. E nós também precisamos usar uma linguagem mais humana, que saiba lidar com as aflições e as desventuras das pessoas. Sem circunlóquios e sem emendas, sem falsas esperanças e sem ilusões, sem imediatismo e embustes.

Qual o tipo linguagem estamos usando? Uma linguagem bem distante da realidade das pessoas do nosso século, impregnada de fantasias ufanista.

Qual a linguagem precisamos usar? Uma linguagem de gente para gente, de pessoa para pessoa, que encaram a vida como Jesus encarou e não fugiu de nenhum dos dramas que a humanidade enfrenta, nem do seu tempo nem do nosso. Jesus levou as pessoas a sério. E, até os dias atuais, os sofrimentos não mudaram, mas o mesmo Jesus se compadece de todos dizendo: “...Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16.33).


Paz seja convosco!

André Santos



[1] PETERSON, Eugene H. A Maldição do Cristo Genérico, São Paulo, Ed. Mundo Cristão, 2007, ps. 255,256.

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